“A change is as good as a Holiday” foi o ditado citado por uma grande amiga Sul-Africana que tentava me consolar enquanto ouvia minhas queixas sobre transformações no ambiente de trabalho.
Bom, certamente, eu adoro férias. Nenhuma dúvida acerca disto. Mudanças? Daí eu já não sei. Na verdade, sei sim: eu as odeio. Profundamente. Afinal, o que se pode esperar de uma virginiana que adora ter controle sobre absolutamente tudo e encontra paz e alegria na previsibilidade?
Entretanto, pensando na analogia entre o conceito de “mudança” e o tão desejado momento de folga, passei a refletir um pouco mais sobre o assunto e lembrei de um filme a que assisti recentemente chamado “O quarto de Jack” (“Room”).
A trama é sobre uma mulher (Joy) que é feita refém por muitos anos, passando a viver trancafiada em um quarto, sujeita a todo tipo de abuso que se possa imaginar. Molestada, inclusive, sexualmente, ele engravida do agressor e tem um filho lindo chamado Jack. No intuito de poupá-lo de maior sofrimento emocional, Joy transforma esse quarto, que, em verdade, era seu cárcere, num ambiente lúdico (acreditem!), enfeitando-o com desenhos feitos por Jack. O vazio e austeridade do ambiente é preenchido com muito amor e histórias contadas para embalar o sono daquela criança, que enxerga ali um abrigo seguro e feliz.
Num determinado dia, eis que surge uma raríssima janela de oportunidade na vida de Jack: fugir enrolado num tapete em um caminhão. Para assegurar-se do sucesso da empreitada, Jack treinou, repetidas vezes, a manobra de manter-se estático, dentro do tapete, respirando suavemente, de modo a passar desapercebido. É claro que tudo podia dar errado. Qualquer imprevisto e o plano iria por água abaixo. Mas o garotinho se mostrou extremamente corajoso, mesmo em circunstâncias tão adversas.
O aspecto que mais me tocou neste filme foi o momento em que o plano foi posto em ação (a partir de agora, aviso que haverá spoiler). Nesta hora, Jack titubeou por alguns instantes. Não porque temia que o plano desse errado (o que seria, acredito, o receito de qualquer um), mas, precisamente, porque iria sentir saudade do quarto. Afinal, sob a sua perspectiva, aquele era um ambiente seguro e conhecido. Já o mundo lá fora? O que esperar? E aqui fica claro para nós, espectadores, como o medo pode realmente embotar nossa noção do “bom” e do “ruim”.
Ao final, o filme deixa antever os problemas psicológicos enfrentados por Jack após a libertação, o que, de fato, é bem compreensível. Todavia, o drama possui um tom esperançoso, ao menos esse foi o meu sentimento. E percebi que o medo da mudança pode ser extremamente traiçoeiro. É incrível como somos capazes de nos agarrar com unhas e dentes a uma situação claramente desfavorável apenas por temer sair de nossa zona de conforto.
Realmente, acho que minha amiga tem razão: a mudança pode ser tão bem-vinda quanto umas boas férias. Afinal, a mudança é uma oportunidade para recomeçar e perceber que o status quo talvez seja, em verdade, um cárcere, que nos priva de viver experiências fantásticas. Que tenhamos a mesma coragem e obstinação de Jack!
Change
“A change is as good as a holiday” was the saying quoted by a great South African friend who tried to comfort me while listening to my complaints about changes in the workplace.
Well, certainly, I love holidays. No doubt about that. Changes? Regarding this, I am not so sure. Actually, I do know: I hate them. Profoundly. After all, what could be expected when it comes to a Virgo who loves to have control over absolutely everything and finds peace and happiness in predictability?
However, thinking of the analogy between the concept of “change” and the much desired leisure time, I started to ponder a little bit more about the subject. At that point, a movie that I watched recently popped up in my mind.
The movie, called “Room”, tells the story of a woman (Joy) who is held hostage for many years and starts living locked up in a room. She suffers all kinds of mistreat that could be imagined. Abused, even sexually, Joy becomes pregnant by the assaulter and has a lovely baby called Jack. In order to save him from greater emotional suffering, Joy transforms this room, which, in reality, was her prison, into a lively environment. She decorates the space with drawings made by Jack and manages to fill the emptiness and austerity of the place with so much love and stories that are told to lull her child to sleep. As a result, Jack sees a safe and happy shelter in that environment.
On a certain day, a very rare window of opportunity appears in Jack´s life: the possibility of escape wrapped in a rug inside a truck. To ensure the success of the undertaking, Jack trains himself, repeatedly, on how to remain static, inside the carpet, breathing softly, in order to not be noticed. Of course, everything could go wrong. Anything unforeseen and the plan would go down the drain. But the little boy proves to be extremely brave, even in such adverse circumstances.
What moved me the most was the moment when the plan was put into action (spoiler alert). At that time, Jack hesitates for a while. Not because he was afraid the plan would fail (a very natural feeling, I guess), but, precisely, because he would miss that room. After all, in his perspective, that place was a safe and familiar environment. What about the world outside? What could he expect? At this point, it becomes clear for us, the audience, how fear can really bewilder our notion of “good” and “bad”.
In the end, the movie allows us to foresee the psychological problems that Jack will face after his release, which is quite understandable, given the circumstances. Nonetheless, the plot has a hopeful tone, at least that was my feeling. And I realized that the fear of change can be extremely deceitful. It is incredible how we are able to cling tooth and nail to a clearly unfavourable situation just for the simple reason of being afraid to step out of our comfort zone.
All in all, I believe my friend is right: change can be as welcome as a holiday. Ultimately, change is an opportunity to start over and perceive that the status quo may actually be a prison that deprives us of having amazing experiences. May we have the same courage and obstinacy as Jack!
Dra. Ara Cárita Mascarenhas
Juíza da 7ª Vara Federal/PE